O navio Cosco Shipping Panama,um transportador de contêineres da companhia naval chinesa Cosco, foi a primeira embarcação a passar na nova etapa do Canal do Panamá, no dia 26 de junho de 2016 para a história do comércio marítimo internacional. A expansão é, até agora, a maior obra de engenharia do século XXI. A partir dessa ampliação, um terceiro canal com jogos de eclusas se une aos dois já existentes, permitindo a passagem de barcos três vezes maiores. Cerca de 5% de todo o comércio marítimo mundial passa pelo Panamá. Em teoria, o frete marítimo transoceânico, intimamente ligado com economias em escala, teria impactos imediatos, mas, por hora, não é o que está ocorrendo.

É a primeira expansão da hidrovia, desde a sua inauguração, em 1914. Antes dela, os maiores navios capazes de atravessar o canal (os chamados Panamax) carregam carga equivalente a 4.400 contêineres de 20 pés (Twenty foot equivalent). Depois disso, o número foi elevado para 12.600. Os navios que passam a atender a nova capacidade do canal passaram a ser chamados de New Panamax.

A nova situação animou alguns armadores. A dinamarquesa Maersk, por exemplo, espera terminar o ano de 2016 com mais de 400 trânsitos de navios através do Canal. “Estávamos ansiosos para ver nossos navios maiores passando pelos novos bloqueios”, diz Søren Toft, chefe de Operações da empresa. “A expansão nos fornece mais opções, mais notadamente da Ásia para a América do Sul. É provável que a Maersk Line aumente a utilização do Canal do Panamá e ajuste um ou mais serviços com navios de maior porte para começar a velejar através dos novos bloqueios”, conta Anders Boenaes, chefe da rede da Maersk Line.

O fato é que a expansão terá um impacto notável direto sobre o comércio entre a Ásia e a Costa Leste dos Estados Unidos. Atualmente, 70% das importações americanas vindas da Ásia chegam aos portos da Costa Oeste e seguem de barco ou trem até o destino final. Este trajeto dura cerca de 18 dias. O trajeto feito somente pela água, através do Canal do Panamá, leva 22 dias. Contudo, pode ser entre 10% e 25% mais econômico, dependendo de algumas variáveis. A economia pode ser ainda maior uma vez que os novos navios podem transportar mais contêiners.

Essas vantagens para o mercado norte-americano não se aplicam a muitos países da América do Sul. “O preço do combustível que é utilizado nos navios caiu muito no mundo todo. E isso barateou o custo das viagens”, revela Fernando Serra, um dos autores do estudo “Canal do Panamá: Efeitos da Expansão nos Portos do Brasil”, publicado em 2013 pela Antaq ( Agência Nacional de Transportes Aquaviários). “Além disso, o custo de passagem é superior ao que estava previsto pela Autoridade do Canal do Panamá, o que torna a rota menos atrativa”.

Mesmo assim, o canal é um atrativo para alguns setores do Brasil, como os produtos brasileiros agrícolas e demais perecíveis. “Passar pelo Canal do Panamá tem um custo que não é barato, mas de qualquer maneira, é mais uma via de transporte”, observa Wagner Cardoso, gerente-executivo de Infraestrutura da Confederação Nacional da Indústria (CNI). “A partir do momento em que caem os preços do combustível e do fretamento de navios, as taxas cobradas para passar no Canal do Panamá se tornam mais caras do que navegar dois ou três dias a mais”, avalia Leandro Barreto, especialista em transporte marítimo e professor de logística da FIA/USP. Além disso, no atual momento da economia, não há carga suficiente para justificar a rota. Isso porque, as maiores economias do Brasil se concentram na região Sudeste, que demandam em torno de 80% da demanda por carga. O maior porto do País, que fica em Santos, é localizado na região e navegar pelo Cabo da Boa Esperança, no extremo Sul do continente africano, ainda é a melhor opção de se conectar à Ásia. Uma solução seria a construção de hub ports (portos concentradores) no Norte ou Nordeste para concentrar as rotas dos navios que circulam em direção ao Panamá. “As mercadorias chegariam por esses portos e depois seriam escoadas para o restante do Brasil através de capotagem, explica Michel Bittencourt Weber, co-autor do estudo feito pela Antaq. “Mas vimos que seria necessário fazer uma série de investimentos para que esses portos recebessem embarcações de longo porte, não só em infraestrutura, mas também em tratamento dessas cargas”. Esses portos, caso fossem criados, iriam competir diretamente com os já existentes no Caribe.

A construção do Canal, iniciada em 2007, não é imune às polêmicas. Houve um atraso de 20 meses na entrega das obras e os custos extras imprevistos dispararam o preço até os 5,25 bilhões de dólares, o que causou um conflito entre o grupo construtor, liderado pela espanhola Sacyr, e a autoridade do canal (ACP). Mais do que um grande projeto bem sucedido da engenharia, o canal também é o principal motor econômico do Panamá, dando grande visibilidade ao País no cenário internacional. Além disso, o próprio canal é uma importante atração turística da região. Mais de 230 navios de cruzeiro devem passar por ele na temporada que vai de outubro de 2016 a abril de 2017, segundo informação da Autoridade do Canal do Panamá.

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