Com quase 160 anos de história, o Standard Bank começou suas atividades em 1862 quando foi fundado em Londres sob o nome de Standard Bank of British South Africa. O Standard Bank é o maior agente de ativos do continente africano, tendo ganhado reconhecimento por sua capacidade em gestão financeira e soluções bancárias. Embora tenha sido criado no Reino Unido, suas operações de fato começaram na África do Sul através da exploração de diamantes, atualmente o banco atua em frentes diferentes, se fazendo presente em outras regiões para além do continente africano, como por exemplo o Brasil. 

  Sediada em São Paulo, a base brasileira do Standard Bank é chefiada por Natália Dias, uma executiva com mais de 35 anos de experiência com o mercado financeiro, trabalhando em banco de investimentos no Brasil e nos Estados Unidos, tendo ocupado vários cargos de liderança em diversas instituições, com ênfase em mercado de capitais, empréstimos sindicalizados e fusões e aquisições. 

Natália é graduada em Administração Pública pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e possui especialização em finanças pelo Amsterdam Institute of Finance, além de diversos cursos de liderança, finanças corporativas e bancos de investimentos. Desde 2018 ocupa o cargo de CEO do Standard Bank no Brasil.

    Para contar sua história, Natália conversou com o Portal ATLANTICO sobre sua trajetória, os desafios que superou e o desempenho econômico-financeiro do Standard Bank.

ATLANTICO -Qual o papel que o banco representa nas relações entre o Brasil e o continente africano? 

Natália Dias- O Standard Bank é o maior conglomerado de serviços financeiros do continente africano, tanto em total de ativos, onde temos cerca de 170 bilhões de dólares, quanto em capitalização de mercado, que gira em torno de 17 bilhões de dólares, com listagem na bolsa de Joanesburgo. Temos a maior cobertura geográfica do continente, onde o Banco atua em 20 países da África Subsaariana e também somos a única instituição financeira africana a marcar presença nos grandes centros financeiros globais. Com escritórios em Londres, Nova Iorque, Dubai e Pequim, além de São Paulo, o objetivo destes centros estratégicos espalhados pelo mundo é conectar empresas multinacionais dessas regiões que tenham interesse em realizar negócios com o continente africano. A gente faz isso de 2 formas: através de financiamento dos fluxos de comércio exterior ou, quando as empresas decidem estabelecer uma presença física no continente, nós auxiliamos a estruturar a realização de um investimento estrangeiro diretamente na localidade desejada. Além disso, após o estabelecimento destas empresas no continente, oferecemos um leque diversificado de produtos financeiros, desde operações simples de varejo como cartão de crédito, conta corrente e folha de pagamento para funcionários até soluções mais complexas que englobam assessoria financeira, fusões e aquisições de empresas, listagens nas bolsas de valores de cada país e captação de recursos de médio e longo prazo. 

” O Standard Bank é o maior conglomerado de serviços financeiros do continente africano, tanto em total de ativos onde temos cerca de 170 bilhões de dólares, quanto na capitalização de mercados, que giram em torno de 16 e 17 bilhões de dólares, de acordo com a bolsa de Joanesburgo. “

ATLANTICO- Que experiências positivas do Standard Bank Brasil podem ser levadas para a África e vice-versa? 

Natália Dias- Primeiro é importante salientar que a África é a região do mundo que mais cresce depois da Ásia emergente. Para ter uma ideia desse crescimento, entre 2010 e 2020, o crescimento asiático foi 4,86%, enquanto na África Subsaariana foi de 4%. A média mundial foi 2,8%. A região subsaariana cresceu mais do que a média global e este é um dos fatores que têm atraído muitos investimentos de multinacionais aliados a outras tendências que estão influenciando o futuro da África, como a questão da urbanização, o crescimento populacional e uma renovada estabilidade política. 2020 foi o primeiro ano onde a África registrou um decréscimo de PIB porque até então o continente mantinha um ritmo de crescimento robusto que se sustentava há 50 anos, porém por conta da pandemia houve um recuo de 1,7% do PIB geral africano. Quando se separa por setores, os países que dependem mais do setor de turismo, por exemplo, caíram economicamente algo em torno de 6%, os países dependentes da venda de petróleo como Angola e Nigéria caíram algo em torno de 3,5% e as economias que são mais diversificadas caíram menos. 

Mas o crescimento econômico foi consideravelmente grande em 2021, com a África Subsaariana registrando um crescimento de 4,5% e a nossa projeção é de que o continente irá crescer 3,8% em 2022. O paço acelerado se deve ao fato de que a pandemia teve um impacto menor do que o esperado no continente africano. Uma das possíveis explicações é a média de idade da população africana, que gira em torno de 19.7 anos. Ou seja, é uma população muito jovem em sua maioria, onde aproximadamente apenas 8% está na faixa etária de pessoas idosas. Embora o índice de vacinação tenha sido baixo, algo em torno de 14%, a população jovem tem mais resistência e o lockdown ocorrido em grandes partes da África também contribuiu para que o vírus tivesse dificuldade em se propagar. Essas têm sido razões para que muitos setores acreditem que a nova fronteira de crescimento está na África. Com 1,3 bilhão de pessoas vivendo hoje no continente, há grande possibilidade de a população duplicar até 2050. Isso significa que, no futuro, pelo menos 25% da população mundial viverá na África.

” No futuro pelo menos 25 % da população mundial estará vivendo na África. A população africana será maior que a da Índia, China e da América Latina juntas.”

Image: SESRIC SWOT Outlook 2018 for OIC Countries

ATLANTICO- Em 2017 o Standard Bank angariou U$$122,5 milhões para o “FEENIX“, uma iniciativa para levar educação a jovens com menos recursos financeiros. Qual foi até agora o retorno econômico-social percebido com a implantação do FEENIX? . Que outras iniciativas com o mesmo objetivo são apoiadas pelo Standard Bank? O quanto está sendo investido nestas?

Natália Dias- A FEENIX foi um projeto muito bom porque era focado em criar um plano de fundos para  ajudar as pessoas com educação sem que elas criassem dívidas. Até agora nós conseguimos arrecadar 7,4 bilhões de dólares e impactou 2.800 pessoas; Então foi uma grande ideia. Aqui no Standard Bank, medimos nosso desempenho através do retorno financeiro, então temos métricas a serem atingidas em termos de crescimento de receita, o total de custo em cima desta receita. Mas também medimos nosso progresso através de uma métrica de desempenho chamado SII Impact, que é o impacto social, econômico e ambiental que o banco traz. Essa métrica nos alinhou com as diretrizes de desenvolvimento da ONU.

ATLANTICO- A diminuição das emissões de carbono e a criação de energias sustentáveis são vitais para desacelerar as mudanças climáticas. Financeiramente, como o Standard Bank Brasil tem procurado agir no setor de energias e infraestrutura para combater o aquecimento global? 

Natália Dias- Essa é a pergunta de trilhão de dólares. Há muitas pessoas discutindo o que seria uma “Fair Transition” porque a transição energética irá impactar muito as economias africanas pelo fato de o petróleo compor a economia de vários países africanos e o continente corresponde a apenas 2% das emissões de carbono do planeta. Então é necessário discutir soluções justas visto que a África não contribuiu tanto para o aquecimento global como o dito mundo desenvolvido. Há muitos fatores a serem levados em consideração, como por exemplo os impactos sócio-econômicos da transição energética que ainda não foram bem compreendidos. A área de pecuária, por exemplo, é um setor onde há grande intensidade de emissão de gás carbônico, então nós procuramos os parceiros desse setor que estejam comprometidos com a diminuição das emissões de carbono. Recentemente, nós lançamos nossa iniciativa de comprometimento com o Net Zero através do financiamento do que chamamos de energias de transição. Dentro desta iniciativa temos, por exemplo, métricas para financiar o gás natural que nós consideramos de alguma forma ser uma energia de transição. A própria União Europeia emitiu uma nova taxonomia no começo do ano colocando o gás natural como um “investimento verde”. E todo o continente africano irá passar por este momento de transição energética, respeitando-se a realidade sócio-econômica de cada país. O banco também possui uma reserva de US $15 a US $20 bilhões de dólares que estão sendo destinados ao financiamento 100 % verde até 2026 dos quais US $4 bilhões serão destinados para a criação de  energia renovável. 

A  África concentra 30 % de todos os recursos naturais do mundo, 11% de todas as reservas de petróleo com uma tendência a crescimento deste número, a exemplo de Moçambique, uma das economias mais pobres do mundo e do continente com um PIB de US $15 bilhões e que descobriu recentemente uma reserva de gás natural em seu continente do tamanho do Catar e está entre os 3 maiores players de gás do mundo. Nós já financiamos a construção de uma plataforma flutuante que irá começar a produzir sua primeira demanda de gás natural agora em 2022. Foram US$ 8 bilhões investidos, ou seja, metade do PIB do país, e ano passado a gente liderou também o maior financiamento de projetos no continente africano em uma operação de US$ 15 bilhões para desenvolver o campo de Afungi, que está sendo desenvolvido pela petroleira francesa Total , que é um dos campos deste projeto de gás natural de Moçambique onde tivemos vários funções dentro das etapas de transação, fosse desde o começo realizando pesquisas de viabilidade para o governo, analisando se seria possível fato tornar este projeto realidade assim como também assessoramos players de iniciativa privada em relação a tomada de decisão em investimento,  o que resultou em um total de US$ 500 bilhões investidos no conjunto de todas as fases. 

“A  África concentra 30 % de todos os recursos naturais do mundo, 11% de todas as reservas de petróleo com uma tendência a crescimento deste número”

Plataforma flutuante no Complexo de Afungi, Moçambique. SOURCE:  D.R.-southeusummit

ATLANTICO- Natália, sabemos que você abraça a luta pelo empoderamento feminino. Sua trajetória até se tornar CEO do Standard Bank é um demonstrativo disso. Como você enxerga a participação feminina hoje no mundo corporativo e mais especificamente na área do mercado financeiro? 

Natália Dias- Essa é uma questão bem importante para mim e eu tenho sido uma voz bem ativa em defender a diversidade em uma questão mais ampla. O mercado financeiro ainda é um ambiente bastante masculino e ainda temos dificuldade de colocar mulheres em cargos de liderança. Há um estudo feito em mais de 3 mil empresas dos EUA que constatou que apenas 6 % destas empresas são chefiadas por mulheres e apenas 15% possuem  mulheres no cargo de vice-presidência. E ainda, o estudo mostra que as mulheres que conseguem quebrar essa barreira e chegar até o topo da empresa levam pelo menos 5 anos a mais que homens para conquistar o cargo. Aqui no Brasil, uma pesquisa recente do IBGE mostrou que as mulheres ganham três quartos do salário que um homem ocupando o mesmo cargo ganha. Ou seja, a desigualdade salarial apenas 12% delas têm suas lideranças ocupadas por mulheres. Ainda que haja mais mulheres líderes em Legal Techs  e Techs, o quadro geral levantado pelas pesquisas mostra que ainda há muito a ser feito na busca pela diversidade e equidade nas culturas empresariais. 

” O mercado financeiro ainda é um ambiente bastante masculino e ainda temos dificuldade de colocar mulheres em cargos de liderança. “

ATLANTICO- Você esteve presente em edições passadas do Fórum Brasil África. Quais suas expectativas para o Fórum 2022? 

Natália Dias- Nós sempre aguardamos o Fórum com uma grande expectativa. Acho que o Fórum se estabeleceu como maior evento comprometido em estabelecer relações Brasil-África e sempre há uma composição muito robusta de membros da academia, representantes do governo e cada vez mais representantes do setor privado que possam enxergar oportunidades de negócios e ângulos de cooperação entre as duas regiões. Sempre tenho expectativas altas, o nível das conversas é de um nível altíssimo, os palestrantes são sempre muito bons e o que eu tenho sentido a cada ano que passa é que o Fórum começou com diálogos muito voltados para a academia e questões de políticas públicas para depois ir agregando cada vez mais os agentes privados que são importantes quando se visa negócios. Acredito que esse ano a grande expectativa seja para nos conectarmos presencialmente após o período de pandemia.  

ATLANTICO- Poderia citar algumas metas de investimento, impacto social, ou lançamento e conclusão de projetos que o Standard Bank tenha para 2022 ?

Natália Dias- Do ponto de vista objetivo, nós temos uma meta de crescimento de 8 a 10% no nosso “business” em nosso banco de atacados até 2025, sendo essa a métrica objetiva do banco, e o que estávamos sentindo, e que a área internacional será fundamental, é que as empresas multinacionais têm capacidade para acelerar o crescimento econômico de regiões que sofrem muito com a pandemia, e aqui destaco os mercados do continente africano. Então nossa meta internacional é sempre crescer 5% a mais do que crescemos no ano anterior. 

” Nós sempre aguardamos o Fórum com uma grande expectativa. Acho que o Fórum se estabeleceu como maior evento comprometido em estabelecer relações Brasil-África “

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