O dia 1° de janeiro de 2017 é marcante para os países produtores de petróleo. A partir da data, entrou oficialmente em vigor um acordo firmado entre a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e alguns países produtores fora do grupo, como a Rússia que, em novembro de 2016, aceitaram reduzir a produção em cerca de 1,8 milhão de barris por dia. A medida pode diminuir em 2% a oferta global. Os barris de petróleo, que custavam em torno dos US$ 100 até o final de 2014, chegaram a patamares inferiores a US$ 30 no ano passado, por conta do excesso de oferta. Sem receitas petrolíferas suficientes, os produtores de petróleo africanos, especialmente Nigéria, Angola, Guiné Equatorial, Líbia, Argélia e Egito, enfrentam sérios problemas sociais e econômicos. Com preços baixos por barril, o crescimento econômico em todos os países exportadores de petróleo da África caiu de uma média de 5,4% em 2014 para uma média de 2,9% em 2016. Para Nigéria e Angola, os dois maiores produtores da África, as receitas com o petróleo representam mais de 90% das exportações e mais de 70% do orçamento nacional.

Em setembro de 2016, o Banco Africano de Desenvolvimento (AfdB) anunciou que pretende injetar até US$ 10 bilhões na economia nigeriana através de empréstimos previstos para até 2019. O montante deve ajudar o país a renovar seus setores energéticos e agrícola e também a desenvolver sua infraestrutura. A Nigéria, maior economia da África, lida com sua primeira recessão em mais de 20 anos.

A moeda local, o Naira, está desvalorizada e a inflação supera 17%. “A Nigéria precisa incentivar o seu caminho para fora da recessão”, disse Akinwumi Adesina, presidente do AfDB, durante uma visita oficial ao País. “Com os  incentivos certos, o país sairá da recessão estruturalmente melhor equilibrado”. As exportações de petróleo representam 98% da receita cambial do governo, mas afetam apenas 10% do PIB da Nigéria. Para reduzir essa dependência, o país precisa incentivar o investimento em setores estratégicos não-petrolíferos, como o agroindustrial, impulsionar o setor privado, sobretudo as pequenas e médias empresas, que são as maiores geradoras de emprego, e também estimular a indústria, para substituir as importações. “Não há nenhuma razão para a África gastar US$ 35 bilhões importando alimentos que o continente poderia produzir”, disse Adesina aos jovens empresários em sua visita à Nigéria.

Angola é outro país extremamente afetado pela queda do valor do barril de petróleo. O país viu a produção cair significativamente, de US$ 60,2 bilhões em 2014 para US$ 33,4 bilhões em 2015. A alta dependência da exploração do petróleo fez com que Angola se encontre hoje em uma posição extremamente vulnerável face à queda dos preços. “As estruturas produtivas do país não só foram altamente afetadas pela guerra durante 30 anos como, durante todo esse período, deixaram de ser desenvolvidas”, afirma Cristina Udelsmann Rodrigues, pesquisadora do Nordic African Institute (NAI). “Existem sérias dificuldades em todos os setores, mas sobretudo no âmbito da produção agrícola que carece de investimentos profundos infraestruturais e no da produção industrial, muito afetada pela guerra”. Para a pesquisadora, a agricultura tem sido apontada como o grande potencial de Angola mas também os setores da produção energética e a exploração de minérios apresentam-se como grandes áreas com potencial de desenvolvimento.

Até há bem pouco tempo, a maior parte das economias de crescimento mais rápido do mundo estavam na África, como Angola, Chade, Etiópia, Moçambique, Nigéria, Ruanda e Serra Leoa. O mundo viu surgir uma nova classe média, liderada por jovens empreendedores e acompanhou o crescimento econômico médio do continente, de cerca de 5%. Os altos preços das commodities e a baixa exposição aos mercados financeiros globais fez com que a economia africana passasse incólume pela crise financeira global de 2009. China, Índia, Brasil e vários países europeus passaram a observar as inúmeras oportunidades de investimento na África. Porém, esse clima de otimismo tem sido afetado pela oscilação nos preços de outras commodities além do petróleo, como ouro, diamantes, bauxita, rutilo, madeira e cobre. A realidade não é nada favorável para os países africanos que mais dependem dessas commodities, como Libéria, Moçambique, Nigéria, Serra Leoa e Uganda.

Apesar do efeito devastador causado pela queda nos preços das commodities, outros fatores também podem ter prejudicado as economias desses países, como a atual volatilidade dos mercados financeiros globais, um crescimento mundial enfraquecido, particularmente na China, Brasil e Índia, um aumento dos custos de empréstimos e sérias restrições de infraestrutura, sobretudo no fornecimento de eletricidade.

Segundo o Banco Mundial, a queda dos preços das commodities representa um choque significativo para a região da África subsaariana, já que os combustíveis, minérios e metais representam mais de 60% das exportações da região. Em 2011, o minério de ferro, que era vendido a US$ 191 por tonelada caiu para US$ 45 por tonelada em junho de 2016.

Esse declínio afetou a estabilidade macrofinanceira e reverteu a trajetória de crescimento positivo de países como Serra Leoa, por exemplo, e afetou a balança comercial da África do Sul, que possui uma pauta de exportações rica não só em minério de ferro, mas também em carvão, ouro e outros minerais. Para reverter a situação, os países procuram criar medidas austeras para melhorar suas economias.

Especialistas defendem combate à dependência

A saída para o fim da dependência do petróleo e de outras commodities é, segundo a Comissão Econômica para a África (CEA), o fortalecimento da industrialização, diversificando as matérias-primas e agregando valor aos produtos comercializados. Já o Banco Mundial defende a agricultura e a urbanização como importantes setores para investimentos. “Temos percebido que existe um esforço grande, nos últimos dez anos, de vários países africanos que são exportadores de petróleo, para diversificarem suas economias”, aponta João Duarte Cunha, chefe do departamento de energia, meio ambiente e mudanças climáticas do AfDB. “É importante também investir no setor agrícola e produzir mais. No setor energético, por exemplo, há um interesse muito grande para investimento em energias renováveis”.

“60% da água e de terras aráveis estão na África. Temos também água limpa e uma mão-de- obra jovem. Então a agricultura representa uma oportunidade de reduzir a dependência no petróleo e minerais”, defende Yemi Akinbamijo, diretor executivo do Forum For Agricultural Research in Africa (FARA). “Temos que ser inovadores, temos que tornar a agricultura atrativa para os jovens e temos que usar o poder da ciência”. Ele cita o exemplo do Brasil, que investiu em tecnologia para aumentar a produção. “É o que precisamos fazer na África”, garante. “Se nós fizermos o que o Brasil fez em 50 anos não estaremos mais olhando para o petróleo”.

Angola, Gana e Zâmbia Negociam ou já negociaram empréstimos com o Fundo Monetário Internacional (FMI)
Nigéria Busca aumentar as receitas reformulando o sistema tributário, combatendo a corrupção e recuperando o dinheiro escondido em bancos estrangeiros. O país também deve vender alguns de seus ativos nacionais, incluindo empresas de energia e petróleo
Serra Leoa Anunciou um corte de 30% nas despesas governamentais
Uganda Eliminou os subsídios à gasolina e diesel, suspendeu a construção de novas estradas, proibiu viagens não essenciais ao exterior e freou o lançamento de uma nova companhia aérea
Zâmbia Está cortando subsídios na eletricidade e nos insumos agrícolas
África do Sul O Ministro das Finanças anunciou um corte de gastos sem precedentes de cerca de US $ 1,7 bilhão

Um cenário com uma baixa nos preços do petróleo é bastante positivo para os países importadores do combustível como Quênia, Ruanda e Tanzânia. Os gastos menores podem ser redirecionados para o fortalecimento das obras de infraestrutura, como estradas, pontes e energia.

Sobe e desce

O preço do petróleo oscilou bastante desde 2000. Contudo, o preço vinha estável desde 2011. Nos últimos anos, no entanto, foi registrada uma queda vertiginosa que, segundo especialistas, não está diretamente relacionada com a crise mundial de 2008. O problema é a oferta do petróleo, que passou a superar a demanda. Esse aumento foi impulsionado principalmente pelos Estados Unidos, que aumentaram em 65% a produção entre 2011 e 2014 por conta do aprimoramento do fracking, uma técnica de fraturamento hidráulico que permite extrair petróleo de rochas como o xisto.

Primeiros resultados

Uma reunião marcada para maio de 2017 deve avaliar os primeiros impactos dos cortes planejados pela Opep. Alguns investidores adotam cautela quanto à expectativa geral do mercado para com a eficácia dessas medidas. Um dos motivos é a aceleração da produção na Líbia e na Nigéria, países que têm permissão para produzir mais, dentro do que foi acordado pela Opep.

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