Dados do Aliceweb, um sistema de análise das Informações de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, mostram que a África representou apenas 5,89% da corrente comercial brasileira no ano de 2014, contra 19,54% da União Europeia e 17,16% da América Latina. Em contrapartida, o comércio da África, calculado em torno de US$ 1 trilhão ao ano, tem somente 3% de participação brasileira. O Brasil tem potencial para aumentar sua participação nos negócios do continente. Porém, para isso, será necessário vencer um obstáculo importante: resolver um gargalo logístico envolvendo, sobretudo, o transporte marítimo entre o Brasil e a costa oeste africana. Uma mercadoria que sai hoje do Brasil demora entre quarenta e sessenta dias para chegar à Africa, a custos elevados.

“O custo é alto porque o volume é muito pequeno. O navio vai cheio e quando chega lá não tem praticamente nada para carregar de volta. E isso acaba interferindo na questão do frete. Você tem um custo de retorno do navio, o que acaba sendo diluído no preço”, explica Rui Mucaje, presidente da Câmara do Comércio Afro-Brasileira, que faz uma comparação com a China. Assim como o Brasil, o país asiático compra commodities da Africa. Porém, ao contrário do Brasil, a China vende para os africanos produtos com elevado valor agregado. Esse desequilíbrio resultou, no ano de 2014, em um déficit na balança comercial do Brasil nas relações comerciais com a África de cerca de 7,36 bilhões US$ FOB, segundo dados fornecidos pelo governo brasileiro.

“O que nós compramos na África é, aproximadamente, 95% petróleo e fertilizante. O que nós vendemos para a África é carne de frango, açúcar e cereais. Essa mercadoria para a África responde entre 60 e 70% das nossas exportações para África. Então, a grosso modo, podemos dizer que compramos petróleo e vendemos comida”, argumenta Altair Maia, consultor de comércio exterior. “Nós somos deficitários. Na área de commodities é difícil aumentar sem final previsível, o volume de exportações. Até porque o preço das commodities está caindo em todo o mundo. Para o Brasil se tornar superavitário seria necessário levar para a África produtos manufaturados, como sapatos, roupas, móveis, automóveis, tudo. Praticamente todos os países da costa oeste africana importam de 50 a 90% tudo o que consomem”.

Além de promover a exportação de produtos com maior valor agregado, acordos bilaterais também poderiam amenizar os custos do transporte marítimo entre o Brasil e a África. Atualmente, o único acordo bilateral de transporte marítimo vigente envolvendo o Brasil e um país africano foi firmado com a Argélia, no ano de 1976. Porém, encontra-se em tramitação uma proposta de acordo com Angola. Procurada pela ATLANTICO, a Antaq – Agência Nacional de Transportes Aquaviários – revela que tem acompanhado as relações internacionais do Brasil no tocante ao transporte marítimo e que coleta e analisa dados estatísticos como movimentação portuária, movimentação de contêineres e quantidade de transporte de longo curso, além de participar de discussões em fóruns e reuniões que tratam do assunto.

O TRANSPORTE DA MOVIMENTAÇÃO DE CARGA CONTENTORIZADA AFRICANO GLOBAL AUMENTOU EM 7,2% EM 2014, EM COMPARAÇÃO COM UMA TAXA DE CRESCIMENTO GLOBAL GERAL DE 5,4%.

Enquanto isso, líderes de diversos setores produtivos ficam na expectativa da formalização de algum acordo que crie uma linha direta entre o Brasil e a África. “Isso iria favorecer muito o Congo, a Angola e Guiné Equatorial, que tem muitos investimentos de empresas brasileiras”, aponta Vilton Lima, presidente a Câmara Empresarial de Comércio, Indústria e Agricultura do Congo, que defende o porto de Point Noir como hub para os países da África Central. “Lá, nós temos um porto profundo, que uma estrutura muito boa. O porto passou por obras de melhoria e tem capacidade para receber navios de grande porte”. Rui Mucaje, da Câmara do Comércio Afro Brasileira, por sua vez, defende que a criação de linhas marítimas entre o Brasil e o continente africano priorize o porto de Walvis Bay, na Namíbia, e Las Palmas, nas llhas Canárias. “Praticamente todo o transbordo de mercadoria do Brasil, passa por lá. O porto já é um hub e pode ser intensificado”, diz. “Existe uma capacidade ociosa muito grande por conta da diminuição de navios do Brasil para os destinos africanos e do aumento da presença asiática na África”.

Uma outra solução é fazer com que os navios que trafegam no Atlantico entre a América e a Europa e entre a Europa e a África façam uma “escala” em algum porto do oeste africano. “Todo o transporte internacional de manufaturados brasileiros é feito por companhias estrangeiras. Então nós ficamos totalmente a mercê dessas companhias”, aponta o consultor Altair Maia. “Quando um navio sai da costa brasileira em direção à Europa, ele passa a menos de 500 milhas do continente africano, onde, no entanto, ele não faz escala. Então, seria necessário reunir essas empresas que fazem esse transporte para discutir os custos e os benefícios dos navios saírem do Brasil, fazer uma atracação na África e de lá seguir para Europa”, revela. De uma forma ou de outra, uma linha marítima entre Brasil e África fortaleceria – e muito – os negócios entre o país e o continente africano a partir de uma redução drástica nos custos logísticos e também no transit time. A mercadoria que sai hoje do Brasil demoraria entre oito e dez dias para chegar à África.

TODO TRANSPORTE DE MANUFATURADOS BRASILEIROS É FEITO POR COMPANHIAS ESTRANGEIRAS

FOB
A sigla FOB significa free on board e em português pode ser traduzida por “Livre a bordo”. Neste tipo de frete, o comprador assume todos os riscos e custos com o transporte da mercadoria, assim que ela é colocada a bordo do navio. Por conta e risco do fornecedor fica a obrigação de colocar a mercadoria a bordo, no porto de embarque designado pelo importador.

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